Inferno ou paraíso? O futuro do Madeira















As usinas do Madeira, ditas como o “progresso”, é o progresso da violência e de tantos outros impactos sociais. As hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau são incógnitas. Tem gente que prevê boas novas para o Estado; outras, como eu, vêem o inferno se aproximando.


Porto Velho, proporcionalmente uma das cidades mais violentas do País, estruturalmente não tem condição para suportar um boom populacional. Apenas 3% da cidade têm saneamento básico; a saúde beira a morte – um hospital público, um pronto-socorro e uma maternidade para atender as mais de 400 mil pessoas residentes no município e dezenas de outras do interior de Rondônia; o trânsito é caótico comparado ao das grandes metrópoles – uma pesquisa revelou que há um carro para cada 5 pessoas; o mercado de trabalho é dependente do funcionalismo público, aquecido por essa parte da população, e o número de desempregado cresce a cada dia.


As usinas trarão dinheiro, dinheiro atrai mercado, mercado atrai emprego, emprego atrai gente, gente atrai mais gente. O círculo vicioso movido a energia será a grande esperança dos brasileiros de melhorar de vida. Mas há um bordão que diz “tudo que é bom dura pouco” e resume esse ciclo “do ouro”. Se antes éramos dependentes do funcionalismo público, hoje dependeremos dessas megas obras e o problema é que uma hora ela termina e o dinheiro vai embora.


As usinas do Madeira vão produzir 6.450 megawatts, 29 vezes a potência da Hidrelétrica de Samuel (216 Mw), localizada no rio Jamari (Rondônia), o que corresponde aproximadamente à metade da potência da usina de Itaipu e a 8% da demanda nacional.


Com a Hidrelétrica de Samuel, foram construídas casas para os empregados da obra, hospital (até hoje o único da cidade de Porto Velho), o vilarejo ganhou força e se transformou em cidade (Candeias do Jamari, 25 km da Capital). O impacto ambiental maior foi o nascimento de um lago gigantesco que acompanha a BR 364, sentido Mato Grosso. De acordo com o MAB (Movimento do Atingidos por Barragens), Samuel foi responsável pelo “terror” social, criando grandes bolsões de miséria na periferia de Porto Velho. Na época, 650 famílias foram atingidas “diretamente” pela Usina.


O maior descaso mesmo foi após a construção. O dinheiro foi embora, junto com ele os empregados da usina. E aqueles que vieram atrás de melhores condições de vida tiveram que ir para os arredores da cidade e constituir o que Porto Velho é hoje.


Registros mostram que Itaipu, a binacional, que terminou de ser construída no ano de 2007, em Foz do Iguaçu, duas vezes maior que a do Madeira, não fez diferente. Fez sumir um dos maiores pontos turísticos do País, o Salto das Sete Quedas, desalojou 40 mil pessoas e motivou uma grande operação de retirada de centenas de espécies de animais e plantas da região. E agora que a grana acabou? O que acontecerá com Itaipu?


Historicamente, Porto Velho nunca deu certo. Mega-obras e febres se tornaram grandes tragédias. A estrada de ferro, conhecida como a Ferrovia do Diabo devido às milhares de mortes durante sua construção, e o ciclo do ouro fizeram com que houvesse um processo de povoamento que logo depois criaram “lugares fantasmas”. Quem ficou pôde sentir na pele a punição da floresta; quem sobreviveu tenta esquecer a história. A borracha, a coqueluche dos tempos de guerra, fez muitos trabalhadores terem um caminho sem volta. Cerca de 30 mil seringueiros morreram abandonados na Amazônia depois de esgotarem suas forças extraindo o ouro branco. A cassiterita gerou muita riqueza, sendo porém quase nulos os benefícios produzidos.


Há quem diga que interessados nas obras estão grandes empresas que atuam na produção de alumínio, venda de água, produção de celulose e outras indústrias que usam bastante energia. O MAB acredita que o bem-estar da população do Norte brasileiro não está entre as suas prioridades.


Em nota, o MAB diz que, "beneficiadas pelos altos preços nas tarifas de energia no Brasil, as empresas deverão produzir energia a baixo custo nas usinas do Madeira, vendendo por altos preços à população". De acordo com cálculos do MAB, considerando o valor de R$ 130 por megawatt dos leilões de energia no Brasil e a capacidade de 4.051 megawatt/hora nas usinas do Madeira, a empresa que controlar a obra vai faturar R$ 530 mil a cada hora.


A energia necessária para as indústrias de alumínio, minério e celulose, por exemplo, viria das usinas estatais, cujos preços são mais baixos. O projeto também prevê a construção de eclusas e hidrovias na bacia do Madeira, o que facilitaria o escoamento de minérios – especialmente a bauxita – e da soja. "O nosso rio Madeira terá suas águas privatizadas", resume o MAB, em nota divulgada.


O MAB explica também que a crise mundial de energia está atraindo para países como o Brasil as indústrias que, nas suas nações de origem, já não têm condições de consumir tamanha carga de energia. O Brasil teria uma capacidade ociosa de 72% de produção de energia nos rios. Estudos do governo federal dão conta de que o País ainda pode ter 1.443 hidrelétricas, cerca da metade na região Amazônica.


No caso das usinas de Jirau e Santo Antônio, o MAB estima que serão atingidas cinco mil famílias da região, que terá 500 km² de área inundada. O estudo de impacto ambiental fala em 2,8 mil pessoas, mas, segundo o movimento, estão sendo contabilizadas apenas as pessoas que possuem título de propriedade sobre as terras.


A construção das Usinas do Madeira faz parte de um grande projeto para o desenvolvimento sustentável da região, integração nacional e para a melhoria de vida das populações de Rondônia, Acre, Amazonas e Mato Grosso. As obras, na visão de Lula, livrarão o País de um novo apagão em 2012.


Não que eu seja contra as obras. Sou contra a forma que ela foi imposta. Desde a década de 1990 o governo estava interessado no rio Madeira. Nessa época, se tivessem mesmo interesse em desenvolver a região, deveria haver um processo de urbanização da cidade para suportar o boom populacional. Hoje todos estão correndo contra o tempo para pelo menos diminuir a tragédia social esperada. O meio ambiente, que todos já sabem, sofrerá com as construções. Se tivesse mesmo uma preocupação ambiental, o governo já estaria trabalhando para diminuir os impactos. Até agora não vejo nenhuma movimentação para ressarcir nosso ecossistema amazônico ou por enquanto não se sabe disso. Por esses motivos e outros, e exemplos ditos anteriormente, posso apenas dizer que as usinas do Madeira não passam de um sonho “passageiro”.

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